Artigo do leitor: Advogado considera “arbitrária” prisão de líder de movimento grevista da PM-BA

por Carlos Britto // 04 de maio de 2014 às 19:33

Neste artigo enviado ao Blog, o advogado Ícaro Argolo expõe argumentos sobre o que considera “uma arbitrariedade” a prisão do vereador Marcos Prisco, que liderou o movimento grevista da Polícia Militar da Bahia (PMBA).

Confiram:

priscoREPÚBLICA, MEIA VOLTA VOLVER: O LADO ARBITRÁRIO DA PRISÃO DE PRISCO

Independentemente de termos um número maior de escândalos de corrupção ou tráfico de influência sendo investigados, vivemos uma década de aprofundamento da crise institucional da República. É a sempre bem trabalhada lógica do “toma lá dá cá” entre poderes encrostada nas repartições de cada órgão, sob o ímpeto do beneplácito próprio em desfavor do interesse coletivo que vem prevalecendo.

É nesse contexto que a situação da prisão de Prisco se agrava. Quando juntamos alguns aspectos do ponto de vista jurídico, que passarei a expor a seguir, com os princípios dessa República e sua manipulação feita pelos atores da “parte de cima da democracia”, passamos a nos assustar com a possibilidade de um verdadeiro complô de estado, por aquiescência dos poderes, contra lutadores da classe trabalhadora como Marco Prisco.

Vivenciamos então, uma espécie de república falsificada, moldada nos interesses mesquinhos de membros de cada poder, que a seu bel prazer se move no tabuleiro observando primordialmente no que poderá ser beneficiado. Evidente que ainda temos gente honesta em cada estrutura e órgão, mas como bem disse o baiano Ruy Barbosa: “De tanto ver triunfar as nulidades; de tanto ver prosperar a desonra, de tanto ver crescer a injustiça. De tanto ver agigantarem-se os poderes nas mãos dos maus, o homem chega a desanimar-se da virtude, a rir-se da honra e a ter vergonha de ser honesto.” É por este caminho que o desserviço público acalente a repulsa popular pela transformação social pela via política e democrática.

O sentimento majoritário que pulsa no seio do povo é o de revolta, não pelo volume de corrupção ou desmandos, e sim em ver verdadeiras aberrações acontecerem de maneira impune e abençoadas pela cegueira da justiça. São esses que se aproveitam de uma “indicaçãozinha” nos tribunais de contas, numa procuradoria, num tribunal, talvez os maiores responsáveis pelo crescimento da impunidade. Esses, que se acham acima da democracia dos normais, que contribuem para a violação máxima do estado democrático de direitos contam ainda com o corporativismo comum do judiciário politiqueiro que, mesmo contando com as investigações do CNJ, ainda são maioria e com um braço forte na política do regime democrático.

No meio desta falsa República, as lutas da classe trabalhadora, base de sustentação da democracia dos iguais, se multiplicam como nunca contando com o instrumento da comunicação em rede. Este efeito, que, ao tempo que fortalece e potencializa a resistência popular da classe trabalhadora, reafirma a condição das elites também se articularem em defesa de seus interesses, vistos já não tão republicanos, antagônicos aos da ampla maioria.

Prisco é, neste jogo de xadrez, o pião responsável por causar verdadeira confusão no ambiente de jogo. É a representação da resistência a um sistema de segurança pública falido; à necessidade da desmilitarização, mas para além destas lutas, representa o combate à criminalização da verdadeira democracia de estado, na qual todos podem falar, alguns podem lutar e reivindicar e outros poucos decidem. Sua prisão, arbitrária, ilegal e inconstitucional, é o resultado de uma equação não tão difícil de entender, senão vejamos:

1° – A decretação da prisão foi feita a partir de um suposto Processo (Ação Penal) na Justiça Federal, de 2012. Ocorre que, nesses mais de dois anos a mui digníssima Justiça Federal sequer realizou uma única audiência, o que no mínimo aproxima o acusado à sustentação do cerceamento de defesa, já que não houve a garantia do contraditório. Logo, com o processo “parado”, não há movimentação, não havendo por quê uma decisão cautelar nos moldes que fora arbitrada;

2° – A referida Ação Penal foi construída com arcabouço de fundamentação na Lei de Segurança Nacional – LSN 7.170/83. Legislação tida para a grande maioria dos juristas como medieval e inconstitucional, neste sentido, Luiz Flávio Gomes afirma que “é uma Lei do tempo da Ditadura”, logo desnecessária ao tempo de maior avanço das instituições democráticas contemporâneas. O próprio Ministério Público Federal – MPF, que ofertou a denúncia que culminou na Ação Penal, bem como o Supremo Tribunal Federal- STF, há pouco tempo questionaram tal ordenamento, admitindo sua pronta inconstitucionalidade. No entanto, o MPF lançou mão, sob todas as formas de contradição possíveis, de tal legislação quando lhe foi conveniente. Não se sabe, no entanto, em quais dispositivos dessa Lei o acusado está incurso, já que se trata de acusação genérica, o que também não foi verificado na apreciação do Habeas Corpus – HC feita pelo Ministro Lewandovisk;

3° – Em sua apreciação, o Ministro Lewandovisk “não se atentou” para o fato de o paciente do HC estar investido da condição de Vereador, ferindo frontalmente o disposto no Código de Processo Civil em seu artigo 295, que garante prisão ESPECIAL ou MILITAR para Vereadores. O Ministro também “não se atentou” para a tão falada e conhecida Lei da Anistia. Ainda que tudo o que dissessem fosse verdade, o que está longe de o ser, lhe garantia anistia plena!  Dizem que, pelo fato de ter ficado fora do país, o ministro despachou apenas por meio de informações do site de notícias UOL. Site que, sustentado pela publicidade institucional do governo, noticiou que a Bahia continua com altos índices de crimes contra a vida e o patrimônio, depois do fim da greve, e que as tropas federais continuavam nas ruas baianas por conta disso. Todo mundo sabe que depois da greve a Bahia se “acalmou” e que esses tais índices existem, sim, mas seu volume é constante e alarmante desde algum tempo, tempo este que a Bahia deu uma guinada de aprofundamento nas contradições sob a batuta de certos “trabalhadores” no poder.

4° – No geral, e com base na Lei 8.072, o ordenamento jurídico contempla os seguintes casos de prisão: – prisão temporária de cinco dias, podendo ampliar para mais cinco. Na hipótese de “terrorismo”, seriam trinta dias, prorrogável por igual período, caso necessário! No caso do vereador Marco Prisco, a determinação do juiz foi para noventa dias! Absolutamente ilegal, arbitrária e inconstitucional. É como se fosse dado a Prisco sua plena e antecipada condenação.

5°- Segundo consta na denúncia, o MPF alega que o movimento de 2012, por ocupar a área externa da Assembleia Legislativa, “impediu o bom andamento dos trabalhos daquela Casa”. Ora, se isso estivesse alcançado pela verdade dos fatos, suas Excelências Deputados (de situação e oposição) não assinariam uma declaração tachativa onde dispõe que naquele período a Casa funcionou Normalmente! O que já reduz à pó a referida denúncia.

6°- Há ainda os que preferem sustentar seu raciocínio com base no “plim plim”, que (lembremos, recebe um vultoso repasse institucional e naquele período viu seu carnaval ameaçado, o que comprometeria ainda mais sua arrecadação) picotou horas e horas de escuta de modo ilegal e construiu uma fala transformando o vereador em um incendiário, coisa absurda que não foi comprovada exatamente porque não existiu. Basta ver a própria denúncia do MPF que circula pela rede.

Esses são alguns rápidos aspectos desta grande contradição republicana que, além de demonstrar a força de influência do Poder Executivo sobre os demais, coloca-nos à condição de reflexão sobre um futuro não tão distante: Na hipótese de o PT sair do centro do poder, o que tudo indica, certamente continuará firme e forte dando a linha na máquina pública interpoderes, pela sua ainda forte ramificação no seio dos servidores, sindicatos e movimentos de insulamento político e nas instituições do cenário político.

Ícaro Argolo/Advogado

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