O poeta, jornalista e publicitário Carlos Laerte derramou seu olhar crônico sobre o Carnaval de Petrolina (o de hoje e os de outrora), traduzindo a folia como só ele sabe fazer.
Boa leitura:
O azul do céu era o mesmo a reluzir na barba espessa e branca do cavalheiro de listas à espera na calçada do Cubículo. O Carnaval estava só começando e, ainda que nascente, nos despedimos entre abraços e desejos de uma boa folia quando já anoitecia na velha nova Petrolina Antiga. Ali no mesmo canto e sobre as pedras ainda não asfaltadas por onde um dia passaram Piratas Reis do Samba, Lacerdinhas, Ioiôs e Marias Magas.
O ágil e desengonçado Zenildão caía no chão toda vez que uma moça passava e ali ficava fazendo de conta que era um desmaio, mas no fundo era apenas matreirice, só pra ver o que vinha por baixo da saia das passistas. Os meninos de Atrás da Banca saíam pelas cercanias de noitinha simulando uma briga com um pau ameaçando o outro. E aí, quando os desavisados das ruas da frente percebiam, já estavam com as mãos sujas e mal cheirosas.
Pela manhã na Praça do Bambuzinho, a folia só começava depois do banho com nossas possantes bombas d’água. Ali na Souza Filho, por onde desfilavam as batucadas, escolas de samba campeãs e campeoníssimas segundo Simão Durando, não passava um carro ou um ser vivente que a nossa brincadeira não molhasse todo. E o “Mela-Mela” continuava nas manhãs de sol do Petrolina Clube, nas tardes de suor e cerveja da 21 de Setembro e no dia já amanhecendo no Iate Clube. “Raiou, resplandeceu, iluminou…”, cantava a Charanga de José Coelho.
Seu Macedo da Principal, de sombrinha de frevo na cabeça, replicava entre volteios pelo salão e pulos na piscina. Quem não viu Nelson Moura de fidalgo e Inah Torres de melindrosa pensa ter sonhado com Charles Chaplin, pra cima e pra baixo, num sábado de Zé Pereira, lá na Guararapes. Mas foi tudo verdade, ainda que se acabando na quarta-feira. Taí Eribaldo Bezerra, que até hoje guarda a fantasia.
Palmilhando agora pelas ruas que andei, vejo na barba azul de Justino homenageado as mesmas listas do folião que passa de celular na mão em troças e blocos desgovernados. Um carnaval em cada esquina e a multidão de corações democratas atrás da Frevuca. Fantasiadas crianças e seus cabelos pintados de tudo quanto é cor. Um bando de meninas de corpo tatuado ali na mesma esquina de Dona Josepha, e uma música matingueira que soa pelos alto-falantes do antigo açougue municipal: “minha carne é de carnaval…”
Carlos Laerte/Poeta, Jornalista e Publicitário
Bela crônica, parabéns ! Vivi todas essas coisas e restou a saudade.
Carlos Laerte!
É assim que se faz o registro!
Em 1977, tinha dez anos e um dos temas de um álbum de Geraldo Azevedo intitulava o tema “Cadê meu Carnaval “, vem o poeta Laerte pra buscar esses bons dias, de outrora e os atuais.
Parabéns Laerte pelo contexto.
Salve esses momentos e a história continuará.
Fazemos parte do contexto.
Abraço irmão!
Laerte, já pensou em escrever e publicar livros sobre o passado de Petrolina? Sobre o carnaval, sobre as pessoas ícones, sobre o que você viu e viveu etc. E parabéns pelo artigo, muito bom!
O azul do céu pode ser o mesmo, Carlos. Mas o Carnaval, jamais. A musica é grega. A (in)segurança é dos novos tempos. Ouso dizer que o São João é mais tradicional !