As homenagens ao deputado Osvaldo Coelho não cessam. Desta vez vamos publicar um texto do ex-ministro da Fazenda e do Meio Ambiente, o pernambucano Gustavo Krause, que faz revelações interessantes. Mais que um artigo, é uma bela homenagem em um texto muito legal. Leiam
“Você conhece legislação tributária?”. Com esta pergunta, o então secretário de Fazenda de Pernambuco, deputado Osvaldo Coelho, idos de 1969, começava a conversa com um recém-formado bacharel em direito, na época, simples estagiário da Auditoria Fiscal. Ali estava eu, sentado, atordoado, sentindo uma estranha redução da minha pequena biometria, um verdadeiro liliputiano, diante daquele homenzarrão que estava disposto a me resgatar das estatísticas do desemprego, mas que, pelo peso do corpanzil e força do secretário todo-poderoso, parecia me esmagar.
Osvaldo colocou em marcha, sob a liderança do Governador Nilo Coelho, robusto processo de modernização da administração pública do Estado de Pernambuco. Em relação à gestão fazendária, reafirmo: a história da Secretaria da Fazenda tem duas fases, antes e depois de Osvaldo Coelho. Ele eliminou vícios e distorções decorrentes do apadrinhamento político, fundou uma meritocracia pelos concursos públicos, oxigenou os quadros e criou uma burocracia estável, competente, séria, que prestou grandes serviços ao Estado.
Voltemos ao início da conversa. Aquela audiência tivera as bênçãos do meu ex-professor, então secretário de Educação e homem público exemplar, o ex-governador Roberto Magalhães que, generosamente, me indicara para o cargo de adjunto de auditor fiscal, que ampliava as funções da Auditoria Fiscal. “Tenho estudado muito e estou por dentro da legislação sobre o ICM”. Resposta rápida. Mentira. Sabia nada. Direito tributário sequer fazia parte do currículo da Faculdade de Direito.
Ele acreditou ou fez que acreditou. E disse: “Vou nomeá-lo e você vai ser adjunto de Souto Borges”. Não tive tempo para alegria. Disse com os meus botões: “Logo José Souto Maior Borges, o mais renomado jurista do Brasil (e continua sendo) na matéria, e eu, seu adjunto, ignorante na matéria”. Deu vontade de desistir. Porém encontrei em Souto o verdadeiro mestre, paciente, solidário, compreensivo, uma das pessoas a quem devo grandes lições e exemplos de vida e de espírito público.
A partir de então, o meu destino e o de doutor Osvaldo se entrecruzaram vezes incontáveis, e esses encontros me autorizam a reiterar o testemunho sobre o grande político que Pernambuco, hoje, pranteia.
Na terça-feira, 27 de outubro, fui visitá-lo. Nada, nem a doença nem o tempo afetavam a força das ideias. Senti o enlevo da despedida, embora o assunto tenha sido o Brasil – as possibilidades do semiárido e o futuro -, entrecortado pelas boas risadas do inabalável senso de humor. Palavras finais: “Lembre-se, a vida ensina a grandeza dos valores do perdão e da gratidão”. Recebi queijo de cabra e uvas, presentes da terra que cultivou e em que semeou suas crenças.
Visionário. Missionário. Moderno porque nele o Sertão fez-se corpo, alma, como terra da promissão. O mais universal dos provincianos e o mais provinciano dos universais, para ele, Petrolina é raiz e centro do mundo, trata-se de uma obra humana feita de pedra, uma ode ao progresso, um poema ao trabalho que liberta o homem da fatalidade da pobreza e abre os horizontes da prosperidade.
Sempre que o ouvi, defendendo as bandeiras da difusão do conhecimento, da educação para o trabalho e para inovação tecnológica, do empreendedorismo para a democratização de oportunidades, do progresso, eu pensava: doutor Osvaldo é movido pela profecia de Euclides da Cunha: “Estamos condenados à civilização. Ou progredimos ou desapareceremos”. Osvaldo enxergava a possibilidade de transformar o sertanejo naquilo que Euclides chamava de “rocha viva da nacionalidade”.
Missionário. Assim se fez na política. Tomou como missão de vida transformar a “Povoação de passagem de Juazeiro” no verde jardim das oportunidades, nesta metrópole/ jóia debruçada sobre o Rio São Francisco. No exercício da representação política, varou madrugadas na Comissão de Orçamento, em vigília, na defesa das emendas para a região, bateu nas portas dos governos, peregrinou pelos ministérios, esteve em todos os lugares para reivindicar em favor de sua terra e de seu povo.
Um progressista nas idéias e na prática. Até mesmo os adversários que, se alguma vez, ensaiaram o coro injusto ou a etiqueta falsa do conservador ou oligarca, calaram-se para sempre diante da vitalidade do corpo e da alma do sertanejo que não sentiu as marcas do tempo.
Seus descendentes e sua gente, Pernambuco e o Brasil devem respeito, reverência e rogam, neste momento, as bênçãos e o descanso merecidos.
Gustavo Krause/Consultor e Ex-ministro da Fazenda e do Meio-Ambiente