Artigo: Um mestre da MPB chega aos 70

por Carlos Britto // 08 de agosto de 2012 às 20:00

Um dos maiores nomes da Musica Popular Brasileira completou ontem (07 de agosto) 70 anos de vida esbanjando energia e “inventividade”. Caetano Veloso – Caê, para os íntimos – merece todas as homenagens pelo que representa para o cenário artístico tupiniquim.

E uma dessas homenagens é do jornalista, pesquisador e professor Emanuel Andrade, neste artigo que enviou ao Blog. Confiram:

Caetano: Um camaleão sempre mudando de cores aos 70

“É incrível a força que as coisas parecem ter quando elas precisam acontecer”. A frase é lá dos anos 80, numa entrevista de Caetano Veloso a uma revista popular. Não interessa se é filosófica, poética ou não. Pode ser interpretada por diversos ângulos. Já que é do cantor/compositor que o Brasil inteiro conhece por suas diversas facetas. Foi um dos mentores da irreverente Tropicália, na década de 60. Mas quero pontuar dentro da trajetória de seu autor. Motivo: 70 anos de vida do filho de Santo Amaro da Purificação (BA) que se completa hoje, 7 de agosto. Leonino, é mais um setentão da trupe da MPB, ao lado de Gil, Milton Nascimento, Chico e Paulinho da Viola.

Assim como os colegas, Caetano já carimbou seu imensurável legado na plataforma do cancioneiro popular brasileiro. Queiram, gostem ou não! Antes de pisar no território da música diante das influências infantis, pensou em ser pintor, escritor, cineasta… Chegou a escrever sobre cinema em jornais de Salvador. Na música, flertou com todos os gêneros – da Jovem Guarda à Bossa Nova. Mergulhou na fonte de Gonzaga o, no auge da censura militar, quando, em tom nostálgico e dramático, fez sua Asa branca voar triste em solo londrino, na época do exílio.

Na volta ao Brasil, fez os manifestos Jóia e Qualquer Coisa (em forma de discos). Nos dois, também se deleitou nos acordes da beatlemania, gravando canções clássicas como Help! Ainda nessa fase, jogou-se na folia mais popular do planeta, com o disco “Muitos carnavais”, acompanhado de uma orquestra de frevo. Nada de guitarra baiana.

Ao longo da carreira, foi de xote, de rock, de samba, rumba, merengue, pagode, valsa, fado, música latina, entre outros estilos. Compôs para trilhas sonoras e fez filmes. Pintou o sete e as canecas com seus conterrâneos da axé-music. Sem se preocupar com o pudor intelectual, se deleitou no lema brega ao se conectar com Odair José e Peninha. Na imprensa e/ou nos bastidores, soltou o verbo em algumas brigas. As mais famosas foram com o cantor Fagner e o jornalista Paulo Francis (In memoriam).

Críticas a seu trabalho e comportamento nunca lhe faltaram. Ora respondeu com peito e voz alta, ora mandou respostas endiabradas em versos. Ficar nu em uma participação relâmpago como figurante surpresa de uma peça teatral (Bacantes) e na capa do censurado LP Jóia, foi o de menos. A força e as coisas de Caetano não parecem ter ou ser, elas são. E muitas dessas coisas ele descasca sem adjetivos, no livro Verdade Tropical.

Há poucos anos – já com mais de 60 no RG – Caetano veio a Petrolina, fazer seu show da turnê Cê. Foi um show jovem, maduro, irreverente e com ar de rock n’roll. Em entrevista, me falou sobre parte dos assuntos acima. Até mesmo da misteriosa composição O Ciúme, que tem como pano de fundo o rio São Francisco, Petrolina e Juazeiro. Muita gente adora, mas não sabe que a canção nasceu por aqui nos anos 70, diante, segundo contam, de um fato doloroso: coisas do coração. Ele não escondeu, mas em tom metafórico. A canção só ganhou corpo em 87 e impulsionou inúmeras regravações.

Bem, acontece que Caetano chega aos 70 anos. Já disse que tinha “medo da morte e das coisas ruins que há no mundo, mas tinha alegria por estar vivo”. Muitos questionam se ele está velho ou envelhecendo. É natural. Em seu disco Velô (1984), o baiano escreveu a bela – O Homem Velho, onde pontua quem sabe, que as coisas precisaram acontecer para ser como foi ou está sendo até aqui. E aí, cantou em certo trecho: “Os filhos, filmes, ditos, livros como um vendaval / Espalham-no além da ilusão do seu ser pessoal / Mas ele dói e brilha único, indivíduo, maravilha sem igual / Já tem coragem de saber que é imortal”. Imortal ninguém nesta terra, há de ser. Mas sua obra não deve morrer jamais, nem daqui a mais 70, 100…anos.

Emanuel Andrade/Jornalista, Pesquisador e Professor da Universidade do Estado da Bahia (Uneb)

Artigo: Um mestre da MPB chega aos 70

  1. Carlos Laerte disse:

    Meu caro Emanuel. Rico em
    informações e pontuado por uma elegante escrita,
    seu artigo impressiona pela precisão da narrativa
    e emociona quando revela a simplicidade do homem
    na pele do genial artista que é Caetano,
    em qualquer idade.

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