O Instituto Regional da Pequena Agropecuária Apropriada (IRPAA) enviou uma carta aberta à imprensa criticando o pedido do prefeito Júlio Lóssio (PMDB) para que a Embrapa Semiárido integrasse a agricultura irrigada às pesquisas e experimentos do órgão.
De acordo com o IRPAA, a Embrapa deve continuar investindo nas pesquisas para reduzir as desigualdades sociais do Semiárido. A entidade ressalta que a irrigação cumpre seu papel econômico na região, mas tem seus limites climáticos e sociais, além de contribuir para a concentração de terras e “favelização” das duas principais cidades do Vale do São Francisco (Petrolina e Juazeiro).
Confiram a carta do IRPAA na íntegra:
“A sociedade organizada do Semiárido brasileiro tem a responsabilidade sociopolítica de se manifestar em defesa do trabalho desenvolvido pela Embrapa Semiárido, que desenvolve vários projetos de pesquisa e extensão contemplando diversas áreas do conhecimento e considerando a diversidade de realidades e culturas da população e do clima da região. A referida empresa foi recentemente provocada por um gestor público pernambucano para tornar seu trabalho exclusivo para áreas irrigadas.
Os números apresentados em Carta enviada à Embrapa Semiárido pelo gestor pernambucano, tendo como fonte de dados o Ministério da Integração Nacional, são alarmantes, reais e históricos, mas não podem servir como justificativa para tirar a Embrapa Semiárido dos caatingueiros e caatingueiras, que não vivem nas pequenas manchas de solos viáveis para irrigação.
É verdade que a irrigação cumpre um papel importante na economia regional, mas tem os seus limites climáticos e sociais. Gera riquezas tendo como base, principalmente, a produção para exportação às custas, muitas vezes, de subempregos ou trabalho degradante, uso abusivo de agroquímicos, concentração de terras, de renda, favelização das duas principais cidades da região. Apesar disso, sabendo da importância desta atividade, a Embrapa sempre investiu grande parte do seu orçamento em pesquisas e extensão voltadas para irrigação.
A missão da empresa é desenvolver ciência e tecnologia que contemple a diversidade socioambiental da região. O Semiárido brasileiro é o mais chuvoso do planeta e é também o mais populoso, sua cobertura vegetal composta por caatingas é única no globo. Grande parte da sua população vive em pequenas cidades, a maioria espalhada em pequenos povoados classificada como população difusa. Esse é e deve continuar sendo o campo de atuação da Embrapa Semiárido, contribuindo com a construção de um novo paradigma de desenvolvimento para esta região, pautado nos elementos da proposta de convivência.
A Convivência com o Semiárido é um modo de vida e produção que respeita os saberes e a cultura local e, utilizando tecnologias e procedimentos apropriados ao contexto ambiental e climático, constrói processos de vivência na diversidade e harmonia entre as comunidades, seus membros e a natureza, possibilitando assim uma boa qualidade de vida e permanência na terra, apesar das variações climáticas.
As tecnologias desenvolvidas pela Embrapa Semiárido a partir das realidades encontradas nas comunidades rurais formam um importante banco de conhecimentos, os quais, transformados em políticas públicas, viabilizam a vida das populações, garantindo geração de emprego e renda, distribuição de riquezas e preservação ambiental. Destaca-se aqui: o zoneamento agroecológico, tecnologias de captação e armazenamento de água de chuva para diversos usos, técnicas de produção agropecuária, beneficiamento e comercialização, com destaque para frutas da Caatinga (a exemplo do umbu e do maracujá do mato).
Estas experiências vêm sendo difundidas por diversas organizações sociais que compõem a Articulação do Semiárido (ASA), beneficiando milhões de pessoas que aplicam na prática esses conhecimentos, o que tem sido fundamental para evitar a morte de milhares de pessoas, o êxodo rural em massa durante o período atual de longa estiagem.
A verdade é que o Estado brasileiro pouco investiu para espalhar pelo Semiárido essa malha de conhecimentos e tecnologias desenvolvidas. Se assim tivesse feito nas últimas décadas, após a longa estiagem ou grande seca do final dos anos 1970 e início dos anos 1980, a realidade atual seria bem diferente. A ASA tem confirmado isso por meio das diversas ações que tem por base a viabilidade da Convivência com o Semiárido.”
Instituto Regional da Pequena Agropecuária Apropriada (IRPAA)
Gostara de saber mais sobre esta provocação, qual contexto? Querer que a Embapa trabalhe somente voltada pra agricultura irrigada é o fim da picada. Esse prefeito poderia usar mais o direto de ficar calado.
O debate é fundamental para o aperfeiçoamento das idéias. Um laboratório de erros e acertos onde se constroe o futuro. O Direito de ficar calado é matéria utilizada apenas no direito processual penal, contemplando a máxima constitucional de que ninguém é obrigado a produzir provas contra si mesmo.