Neste artigo enviado ao Blog, o procurador da República em Salvador (BA), Vladimir Aras, faz uma sincera homenagem ao promotor do MPPE em Petrolina, Júlio César Soares Lira, por ter conseguido a condenação de Carlos Robério Pereira, assassino do seu pai, o auditor fiscal da Bahia, José Raimundo Aras, em 1996.
Confiram:
Este era o poema preferido do sociólogo e auditor fiscal José Raimundo Aras.
Relembro-o como uma forma de homenagear o promotor de Justiça Júlio César Soares Lira, do Ministério Público de Pernambuco, que em 29/nov/2012 fez o plenário do júri na comarca de Petrolina e conseguiu a condenação do executor a 18 anos de reclusão por homicídio duplamente qualificado. Faltam os três mandantes. A vítima era meu pai.
Sendo ele pernambucano, membro do MP e vocacionado ao júri, Júlio Cesar Lira honrou o legado do maior dos nossos tribunos, de mesmo sobrenome, origem e profissão, o príncipe Roberto Lira.
Minha gratidão ao excepcional promotor de Justiça, Júlio César Lira:
“Romance sonâmbulo” (Federico Garcia Lorca)
(A Gloria Giner e a Fernando de los Rios)
Verde que te quero verde.
Verde vento. Verdes ramas.
O barco vai sobre o mar
e o cavalo na montanha.
Com a sombra pela cintura
ela sonha na varanda,
verde carne, tranças verdes,
com olhos de fria prata.
Verde que te quero verde.
Por sob a lua gitana,
as coisas estão mirando-a
e ela não pode mirá-las.
Verde que te quero verde.
Grandes estrelas de escarcha
nascem com o peixe de sombra
que rasga o caminho da alva.
A figueira raspa o vento
a lixá-lo com as ramas,
e o monte, gato selvagem,
eriça as piteiras ásperas.
Mas quem virá? E por onde?…
Ela fica na varanda,
verde carne, tranças verdes,
ela sonha na água amarga.
— Compadre, dou meu cavalo
em troca de sua casa,
o arreio por seu espelho,
a faca por sua manta.
Compadre, venho sangrando
desde as passagens de Cabra.
— Se pudesse, meu mocinho,
esse negócio eu fechava.
No entanto eu já não sou eu,
nem a casa é minha casa.
— Compadre, quero morrer
com decência, em minha cama.
De ferro, se for possível,
e com lençóis de cambraia.
Não vês que enorme ferida
vai de meu peito à garganta?
— Trezentas rosas morenas
traz tua camisa branca.
Ressuma teu sangue e cheira
em redor de tua faixa.
No entanto eu já não sou eu,
nem a casa é minha casa.
— Que eu possa subir ao menos
até às altas varandas.
Que eu possa subir! que o possa
até às verdes varandas.
As balaustradas da lua
por onde retumba a água.
Já sobem os dois compadres
até às altas varandas.
Deixando um rastro de sangue.
Deixando um rastro de lágrimas.
Tremiam pelos telhados
pequenos faróis de lata.
Mil pandeiros de cristal
feriam a madrugada.
Verde que te quero verde,
verde vento, verdes ramas.
Os dois compadres subiram.
O vasto vento deixava
na boca um gosto esquisito
de menta, fel e alfavaca.
— Que é dela, compadre, dize-me
que é de tua filha amarga?
— Quantas vezes te esperou!
Quantas vezes te esperara,
rosto fresco, negras tranças,
aqui na verde varanda!
Sobre a face da cisterna
balançava-se a gitana.
Verde carne, tranças verdes,
com olhos de fria prata.
Ponta gelada de lua
sustenta-a por cima da água.
A noite se fez tão íntima
como uma pequena praça.
Lá fora, à porta, golpeando,
guardas-civis na cachaça.
Verde que te quero verde.
Verde vento. Verdes ramas.
O barco vai sobre o mar.
E o cavalo na montanha.
(in: “Antologia Poética”, Editora Leitura S. A. – Rio de Janeiro, 1966, pág. 53, tradução e seleção de Afonso Felix de Sousa). Federico Garcia Lorca nasceu em Granada, na Espanha, em junho de 1898, e faleceu ali mesmo no dia 19 de agosto de 1936, assassinado pelos “Nacionalistas” com um tiro na nuca.
Vladimir Aras/Procurador da República e filho do auditor fiscal da Bahia, José Raimundo Aras, assassinato em 1996.
Que seja feita justiça também com os mandantes