STF blinda Congresso Nacional de medidas de Bolsonaro que atropelam Legislativo

por Carlos Britto // 07 de janeiro de 2020 às 10:29

Foto: Jovem Pan/UOL reprodução

O STF (Supremo Tribunal Federal) tem barrado atos do governo Jair Bolsonaro com o entendimento de que, na maioria dos casos, desrespeitam a atribuição do Congresso de legislar sobre diferentes temas, sobretudo os de impacto na área social. Nomes da oposição e do meio jurídico veem na atuação do STF um instrumento de contenção de alegados desmandos do governo. A corte decide nesses casos se é provocada por agentes externos, como partidos políticos, OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) e Ministério Público.

O exemplo mais recente foi a suspensão de medida provisória editada por Bolsonaro em novembro para extinguir o seguro obrigatório DPVAT, que direciona recursos à saúde pública. A decisão, por 6 a 4, foi tomada no plenário virtual do STF em 19 de dezembro.

Como a legislação sobre seguro obrigatório regula aspecto essencial do sistema financeiro, para o qual se exige lei complementar [aprovada no Congresso], o tema não poderia ser veiculado na medida provisória“, considerou o relator do processo, ministro Edson Fachin, que foi seguido pela maioria dos colegas.

Em agosto, o plenário do Supremo derrubou, por unanimidade, MP de Bolsonaro que transferia da Funai para o Ministério da Agricultura a responsabilidade de demarcar terras indígenas. Bolsonaro editou uma segunda medida provisória sobre esse tema depois que o Congresso rejeitou a primeira, que já havia tentado fazer a mudança na estrutura da administração.

Recado

O recado mais duro veio do decano do STF, ministro Celso de Mello, durante o julgamento. “O comportamento do atual presidente da República, revelado na reedição de medida provisória clara e expressamente rejeitada pelo Congresso Nacional, traduz uma clara, inaceitável transgressão à autoridade suprema da Constituição Federal e representa inadmissível e perigosa transgressão ao princípio fundamental da separação de Poderes”, afirmou.

Também por unanimidade, o plenário do tribunal limitou, em junho, o alcance de um decreto de Bolsonaro que permitia extinguir todos os órgãos colegiados da administração federal, como conselhos, comitês e comissões –o que, para os críticos, visava restringir a participação da sociedade nas decisões.

Acompanhando o voto do relator, ministro Marco Aurélio, o STF proibiu o presidente de fechar os colegiados previstos em lei, ou seja, aqueles criados pelo Congresso. O ministro Luís Roberto Barroso suspendeu, em dezembro, as alterações que Bolsonaro fez no Conanda (Conselho Nacional da Criança e do Adolescente).

Em outra decisão individual, Gilmar Mendes suspendeu uma MP de Bolsonaro que dispensava os órgãos da administração pública de publicar editais de licitação, concursos e leilões em jornais. Gilmar considerou que o tema não era urgente para vir em medida provisória.

Na área econômica destacaram-se vitórias de Bolsonaro no STF. O plenário autorizou a venda de subsidiárias de estatais sem necessidade de aval do Congresso e licitação. A corte também deixou de interferir na tramitação da reforma da Previdência. O presidente terminou o ano agradecendo ao “nosso Supremo“, que, segundo ele, ajudou a garantir governabilidade.

Aprendizado

O senador Eduardo Gomes (MDB-TO), líder do governo no Congresso, diz ver “com naturalidade” as decisões recentes do STF que barraram atos do governo Bolsonaro. “É o funcionamento pleno da democracia. São os três Poderes interagindo e funcionando com interdependência e com autonomia. Nesse ponto vejo o presidente Bolsonaro muito tranquilo“, afirma ele, para quem o Judiciário exerce seu papel de “equilibrar” as decisões.

Em relação às críticas de interferência excessiva do Executivo no Legislativo, Gomes nega, diz ver “aprendizado” e saldo positivo no primeiro ano de governo. “É um ajuste que vai ter. É o primeiro ano de um governo que foi eleito de uma maneira diferente, com a política muito polarizada“.

Segundo ele, a edição de MPs “depende muito da necessidade e não quer dizer que continue sendo necessário“. “O cenário de relacionamento do governo com o Congresso encontra em 2020 um outro ambiente. Não estamos mais numa queda vertiginosa para recessão ou com uma série de dificuldades que o governo encontrou quando assumiu“, disse. (Fonte: Folhapress)

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