O nosso cronista Will Carvalho escreve sobre a magia do futebol, que parece, fazer coisa de um passado agora distante. Um passeio sobre futebol arte, amor à camisa e a um futebol que deixou de ser mágico para ser apenas comercial. Leiam:
Eu adoro ir à casa do meu avô.
Lá ele tem vários pôsteres de jogadores na parede. Dezenas de camisas e o mais legal: arquivos e mais arquivos de vídeos de jogos de futebol. E aqui, no Brasil!
Nunca entendi porque não temos mais futebol por aqui. Ontem meu avô tentou me explicar.
– Vovô, o senhor chegou a ver futebol aqui no Brasil?
Tentei começar devagar. Mas não teve jeito. Ele me olhou surpreso e ficou com os olhos vermelhos, como se quisesse chorar. Engasgou um pouco, tossiu e disse:
-Anrram.
– E por que não tem mais?
Perguntei logo de uma vez.
Ele tirou de um quadro na parede uma camisa amarela desbotada, quase branca, tinha um número 10 nas costas. Sentou-se na cama, me colocou no colo e começou, como se não quisesse tocar no assunto.
– Meu pai me contava que sempre houve problemas. Acontece que as coisas foram piorando. Criança morta por torcida organizada. Os torcedores sofriam, choravam, davam dinheiro mensalmente pra os clubes. E depois descobriam que os resultados haviam sido manipulados por um juiz mercenário. Times se envolviam com mafiosos.
Os olhos dele estavam longe.
– O país parava pra ver a nossa seleção jogar. Eles usavam uma camisa como essa (e me mostrou a camisa amarela). Mas descobrimos que alguns técnicos recebiam dinheiro para convocar determinados jogadores, só pra que o passe dele fosse valorizado e ele, o clube e o empresário ganhassem mais dinheiro. A Copa do Brasil chegou. A segunda.
– Aquela que o senhor foi com seu pai?
– Sim. Mas pra ela acontecer, bilhões e bilhões de reais foram gastos. Clubes particulares ganharam estádios próprios financiados com dinheiro público. E depois?! Depois tivemos um monte de elefantes-brancos espalhados pelo Brasil.
-Antes, na época do seu avô, nós éramos os melhores do mundo. Nossos craques eram feitos nas ruas. Mas depois disso, eles nasciam em escolinhas de futebol, baseado em tecnologia e estudos. Quase em laboratório. Futebol moleque? Coisa do passado! Era hora de fazer resultado para fazer dinheiro.
– E aí, vovô?
– Aí a gente foi cansando. Nós paramos de ir aos estádios. A magia tinha acabado. O Flamengo jogando com menos de 2 mil pessoas no estádio.
Olhando apenas pras multidões e pros milhões de reais, de dólares, de euros, esqueceram-se dos meninos da Vila. Do torcedor fanático do Juventus da Mooca, do União Barbarense, do Brasil de Pelotas.
– A partir daí foi questão de tempo. O Maraca virou Shopping. Na quarta-feira à noite um novo horário pra novela. O resto é o que você vê hoje.
Ele se levantou e saiu.
Eu – confesso- não entendi nada. Maraca? Magia? Futebol moleque? Acho que o vovô tá ficando velho demais.
Estamos em petrolina
quem liga pro maracanã ?
Triste realidade que se aproxima.
Parabéns ao autor por esse e outros artigos que enviou ao Blog. Muito bons!
Bom artigo, realmente o diálogo com o vovô está relatando o que aconteceu e o que está acontecendo!
Hahhahah Super show seus desenvolvimentos Will
Não tenho nem o que dizer!
Texto perfeito!
Meus parabéns primo!
Arrasou!
Grande Will, como sempre nos brindando com textos muito bem escritos e, sobretudo, prazerosos de se ler! Parabéns, querido.
AAA é verdade, cada vez menos magia em nossos campos!
Hoje é difícil encontrar jogadores que tenham identificação com o clube!
além de que normalmente os jogadores e os técnicos não ficam mais de 2 anos em um clube!
E se são ruins saem por falta de técnica, se são bons saem porque são vendidos!
E é assim, aquela velha história de ” NO MEU TEMPO ERA DIFERENTE!” parece estar cada vez mais aparente…Cada vez menos ídolos, e cada vez menos craques, cada vez menos garotos sendo revelados, mas cada vez mais dinheiro rolando!!!
Mas tudo que vai volta!
Talvez aja uma esperança escondida por ai!
A primeira coisa que disse ao começar a ler o texto foi: Nossa! ele é fantástico. E é isso, Will é fantástico ao escrever, é de uma delicadeza sem igual. Quem falaria de futebol assim, ao ponto de me fazer ter os olhos minados por lágrimas que insistem em cair. Elas vêm porque gosto de futebol – sou torcedor mesmo – mas também venho me desiludindo com o esporte mais ‘popular’ do país. Popular talvez, democrático, tá ficando difícil.
Se a primeira coisa que fiz ao ler o texto foi elogiar o autor, a última foi pedir a Deus que não permita que eu diga isso ao meu neto. Oxalá as coisas mudem!
Acompanho de perto esses textos e dessa vez eu desejo que ele não se realize. Meu coração ficou apertado tentando visualizar isso num futuro próximo! Eu contando aos meus netos como era empolgante ir a um Ba-Vi na Fonte Nova que está na lista dos estádios mais caros para a Copa e pode não dar tanto retorno assim aos cofres públicos. =/